Simulacro do mundo
15:42 postado por Thiago Terenzi
“O escritor é uma das criaturas mais neuróticas que existem: ele não sabe viver ao vivo, ele vive através de reflexos, espelhos, imagens, palavras. O não-real, o não-palpável.”
Caio F.
É que, ao nascer, faz-se a escolha. E não há o que discutir. Escolhe-se, no gênese inicial, a vida ou a escrita. E o escritor não vive – o escritor é triste. Não há – e repito em minha ignorância sábia de rei absoluto – não há alegria na escrita. Escreve-se quem já morreu. Os vivos apenas vivem. Aos outros, tem-se a escrita como quem grita um grito doído: restam-lhe as palavras.
A ele restava o papel. Restava-lhe o ranger do lápis rasgando o papel e o barulho mofado das teclas sob os dedos. Bastava-lhe o cheiro seco das letras e as palavras recém criadas num respiro inicial. A ele a nobreza estava em sabe-se-lá-o-quê de seus olhos. Eram-lhe, as letras, o simulacro de seu próprio mundo. O escritor escrevia como quem inspira o frio. Escrevia – pasmem! – como quem vivia.
Escuta: não há nobreza na escrita.
E ele, entre os livros e escritos, dava-se a viver a vida em carne e osso. Não aos pulos e mergulhos – mas aos goles rarefeitos. É que, ao escritor, tem-se o perigo: morrer em sua não-vida. É preciso, então, ir-se em doses. É que escrever é perigoso – sabe-se lá onde da alma as palavras vão pousar.
E então ele escrevia – e, ao escrever, morria. Ou ao menos fazia da escrita uma meia vida que lhe permitisse respirar. O escritor tem as palavras para não morrer do mundo – é o que lhe resta da vida – vida? E então ele escrevia pois não podia viver. Não lhe era dado o direito à vida. Repito: não há nobreza na escrita. Apenas a vida é nobre.
A ele – plebeu das letras – restou as palavras. Sabe-se lá se por medo ou coragem – mas a ele, restou as palavras. E as palavras – alertaram Clarices, Herbertos e Guimarães – as palavras são perigosas. Sorte a nossa que ainda temos a vida.
Viver é perigoso. Morrer, ainda mais.
29 de agosto de 2009 às 13:03
Thiago. É um prazer penetrar meus olhos em sua escrita. Seu perfil literato é fascinante, suas vomitadas palavras, no melhor sentido da palavra, cativam o leitor [pelo menos aos meus olhos]. Há nuances no letral embrenhado numa busca sem escassez por aqui que está no por trás. Concordo em termo, e vou para duas vertentes. Escrever é perigoso, pois muitos interpretam levianamente e fazem [pré] julgamento acerca daquilo que intitulam conhecer do próximo [escriba], mas ao mesmo tempo um paradoxo, afinal, para todo apaixonado pela tal arte é uma viagem em seu mundo particular, o conhecer de si mesmo e ao automático questões lhes são resolvidas.
Ler-te, vaso, será a partir de agora, minha parada obrigatória, pois seu estilo de escrita faz-me atuar uma caça, aprecio uma boa leitura de alma, 'livro', tu és um livro! Este que há tantas divisórias e em dobras conduz-me as desdobras, trilhar uma aprendizagem múltipla.
.paz!
Priscila Cáliga
9 de setembro de 2009 às 01:09
È meu caro, cada vez mais gosto da tua escrita... Ja ta precisando postar outras aqui, pq apesar do senhor não saber, venho aqui sempre!! heheh
abraçossss
saudades cara!
11 de setembro de 2009 às 11:02
Bom dia, Terenzi. Fico contente em poder ler-te novamente.
Escrever é algo além. É uma realidade i-real. É inexplicável – ao menos, na minha limitação não consigo descrever o que sinto quando tento levar a pena em direção ao papel em branco. São sensações: uma esfera – misturas – de realidades com ilusões.
‘O escritor tem as palavras para não morrer do mundo’
Abaixo, deixo um fragmento de Graciliano Ramos. Tenha um ótimo final de semana. Shalom.
“Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso: a palavra foi feita para dizer.”
11 de setembro de 2009 às 23:14
NOSSA
Fiquei com cara de boba sabe? "Boca em formato de O"
O MENINO BOM NO QUE FAZ.
Eu acho que decidi viver... Fico feliz que pessoas que realmente escrevem bem continuem a escrever.
Continuarei a te ler, ainda que eu nunca volte a escrever.
Bjs
14 de setembro de 2009 às 12:58
=(
saudade.
15 de setembro de 2009 às 11:15
ja iniciou com Caio de Abreu pra ganhar minha simpatia ...
Quando disse então que o escritor não vive e mais pro final citou o que restou...
Lispector e Guimaraes Rosa...
Decidi me tornar seguidora do seu blog