O seu caso de amor - e ódio, porque não? - com Caio Fernando Abreu

16:17 postado por Thiago Terenzi


Luiz Fernando Emediato era um jovem e talentoso escritor contemporâneo e amigo de Caio Fernando Abreu. Ganhou diversos prêmios literários, tornou-se um jornalista de sucesso, mas – mas sabe-se lá o porquê, acabou não entrando no hall dos grandes escritores brasileiros dos anos da ditadura. A seleção natural literária segue caminhos não-lógicos que são difíceis de entender. Sabe-se lá o que vai resistir ao tempo...

Mas vamos ao que interessa: hoje ele é o editor da Geração Editorial e publica livros de diversos autores, alguns conhecidos, outros nem tanto. No site da editora, publica, vez ou outra, textos, crônicas, colunas, tudo muito bem escrito. Num desses textos, com uma coragem que vale ser reconhecida, resolveu contar seu “caso de amor com Caio Fernando Abreu”. É uma história fascinante, que nos mostra Caio sob um outro prisma. O texto vale a pena ser lido:



Meu caso de amor com Caio Fernando Abreu
O editor da Geração revela os comoventes bastidores de uma relação secreta, de amor e ódio, que durou mais de 20 anos, com o escritor Caio Fernando Abreu


Quando conheci Caio Fernando Abreu, em 1976, eu tinha 24 anos, pensava em derrubar a ditadura militar pelas armas e fazia parte de um grupo de jovens candidatos a escritores, músicos e artistas plásticos que imaginavam provocar uma revolução na arte brasileira e mundial, com seus textos críticos, contos, romances, poe-mas, canções, ilustrações e manifestos.

Em 1984, nós nos reencontramos em Gramado, no Festival de Cinema. Os gaúchos Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil tinham filmado um conto meu, Verdes Anos. Outro gaúcho, Sérgio Amon, filmara um conto de Caio, Aqueles Dois. Verdes Anos falava de jovens alienados vivendo na ditadura sangrenta do general Médici. Aqueles Dois falava da amizade entre dois homens.

O socialismo ainda era uma idéia na qual se podia acreditar; usávamos drogas alucinógenas para ficar cara a cara com o Deus no qual não acreditávamos; defendíamos e praticávamos o amor livre; tínhamos toda a coragem do mundo, mas também todas as inseguranças, incertezas e paranóias.

Foi neste mundo imperfeito, em que militares ainda matavam jornalistas e operários, a imprensa e as artes estavam censuradas e o Brasil descobria ter sido falso o “milagre econômico” do general Médici e do economista Delfim Neto que comecei uma relação muito intensa, criativa e comovente, mas também decepcionante e amarga, com o escritor Caio Fernando Abreu.

Começou por meio de cartas, com a descoberta de pontos comuns em nossas idéias e anseios, cresceu com a relação pessoal e a consolidação de uma grande ami-zade e só não virou um caso de amor porque, heterossexual convicto, não pude amá-lo como queria, esfriou com a maturidade e se deteriorou completamente quando, assumidamente homossexual e caminhando para a morte pela Aids, o sombrio e amargurado Caio passou a ver nos heterossexuais e nas pessoas razoavelmente equili-bradas e felizes seres imperfeitos e indignos de contar com sua amizade.

Ao longo de cinco anos, num tempo em que não havia e-mails, trocamos uma vasta correspondência, interrompida quando ele deixou o país e nunca mais retomada depois que ele voltou, principalmente, claro, depois que passou a viver em São Paulo e pudemos conviver pessoalmente, numa relação conflituada e quase sempre absurda.

Paranóico, emocionalmente instável, hiper-sensível, comoventemente frágil e absolutamente infeliz, Caio parecia sofrer todos os dias. Quase nunca sorria. Odiava quem não gostasse de seus amigos e ídolos, como, já nos anos 80, Cazuza, Caetano Veloso, Ney Matogrosso, Miguel Falabella, Rita Lee, Antonio Bivar.

Quatro anos depois, em 1988, Caio vivia extremas dificuldades financeiras. Chamei-o então para trabalhar comigo no Caderno 2 de O Estado de S. Paulo, que eu diri-gia na época. Foi um desastre. Desaparelhado para o exer-cício do estafante jornalismo diário, vivia às custas de pílulas e cada texto a ser editado parecia pesar uma tone-lada para seus ombros frágeis e magros.

Convidei-o para escrever uma crônica todas as quartas-feiras e fez grande sucesso: era, segundo as pesquisas, um dos autores mais lidos no Caderno 2. Mas, chocado com minha agitação, meus gritos diários para editar o jornal no prazo determinado, minha falta de sensibilidade para entender melhor as pessoas de sua condição, passou a ver-me como o chefe careta que usava gravata, enquanto ele usava brinco. Olhava-me todos os dias com olhos de mágoa e desalento.

Eu já tinha fundado a Geração Editorial, no início dos anos 90, quando ele, que convivia dramaticamente com a doença que haveria de matá-lo, pediu-me ajuda. Quis traduzir um romance de Will Self cujos direitos tínhamos comprado e dei-lhe o trabalho e um adiantamento, mas um ano e meio depois devolveu o livro sem uma só página traduzida. Justificou estar estafado por causa da doença, mas continuou escrevendo sua crônica semanal e textos para revistas. Queria devolver o adiantamento, em parcelas. Disse que não era necessário.

Nossa editora publicou um texto dele, reminiscências de sua vida em Londres, no livro Viagem Inteligente, cujos direitos pertencem à Editora Abril, que autorizara a publicação do texto, ao lado dos de Antonio Callado, João Ubaldo Ribeiro, Lygia Fagundes Telles, Luiz Fernando Veríssimo, Gianfrancesco Guarnieri e Nélida Piñon. Recla-mou da edição em termos duros e amargos, chamando-me cerimoniosamente de “senhor editor”.

Respondi com uma carta dura, dizendo-lhe que o fato de estar perto da morte não lhe autorizava ser tão duro e injusto com as pessoas. Acho que a carta foi dura demais – ele nunca respondeu.

Morreu sem que pudéssemos nos ver e falar de novo. Sempre quis procurá-lo, abraçá-lo, dizer que o amava do meu jeito e jamais poderia amá-lo do jeito dele. Sem coragem para dizer-lhe frente a frente o que pensava, uma vez escrevi uma crônica, publicada num domingo, em que lembrava as cartas que um jovem escritor me en-viava, nos anos 70. Caio não foi trabalhar na segunda, e na terça chegou com sua crônica das quartas-feiras falando do cinismo e da mentira. Era a resposta que queria dar.

Hoje, mais de 25 anos depois da primeira carta que nos aproximou, descobri parte daqueles velhos papéis. A maior parte das cartas se perdeu. As nove que restaram, e que publicamos a seguir, revelam a beleza e a tragédia da vida deste grande escritor brasileiro tão precocemen-te falecido. Era o meu amigo Caio. E eu gostava dele.

Os paladinos do oeste e seus sonhos mirabolantes

Minha memória não consegue recuperar os termos de minha primeira carta para Caio Fernando Abreu, no início de 1976. Sei que ele guardou algumas elas, que se encontram hoje na Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro. Naquele tempo – os anos de chumbo da ditadura militar, da censura e da repressão – os jovens escritores brasileiros publicavam seus textos em revistas, jornais e suplementos, e se correspondiam intensamente.

Eu era estudante de Jornalismo e estagiário na sucursal do Jornal do Brasil em Belo Horizonte desde 1973 e editava duas revistas culturais, Silêncio, que a polícia fechou, e Inéditos, que escapou do fechamento, mas ficou, enquanto existiu, sob censura prévia. Havia lido um livro de Caio, O Ovo Apunhalado e acompanhava seus textos pelos suplementos literários. Pedi a ele um conto para ser publicado na Inéditos. Começou aí nossa amizade.

Os jornais diziam que havia um boom na literatura brasileira. Ignácio de Loyola Brandão publicara Zero na Itália, e a edição brasileira acabou censurada. Logo depois Rubem Fonseca teve proibido seu violentíssimo Feliz Ano Novo. Murilo Rubião, um velho escritor mineiro dos anos 40, tinha sido redescoberto e um livro dele, O Ex-Mágico, era adotado em centenas de escolas. Roberto Drummond, com A Morte de D. J. em Paris, também. Roberto tinha sido revelado em 1971 pelo famoso Concurso Nacional de Contos do Paraná. Naquele mesmo ano eu, então com 19, ganhei o prêmio Revelação de Autor.

Desde então, para minha alegria e tristeza, passei a ser considerado – mais pela idade e menos pela obra, creio – uma espécie de garoto-prodígio da nova literatura brasileira. Em 1977, quando publiquei meu primeiro livro, aos 25 anos, o crítico Flávio Moreira da Costa escreveria na IstoÉ que eu não passava de uma Shirley Temple da literatura brasi-leira: surpreendente enquanto jovem, ruim à medida em que fosse envelhecendo. Acho que tinha razão.

Jornais e revistas literárias, todas em confronto com a ditadura militar, surgiam e desapareciam em quase todo o país: Paralelo no Sul, Anima no Rio, Silêncio, Circus e Inéditos em Minas, Escrita em São Paulo, O Saco no Nordeste... Era incrível a agitação, a revol-ta contra a opressão, a criatividade e a diversidade de estilos: do under- ground hippie à literatura de resistência democrática, mistura de arte e jorna-lismo, e entre os dois extremos todo o tipo de experiências. José Agripino de Paula, Sebastião Nunes, Deonísio da Silva, João Silvério Trevisan, Ivan Ângelo, Sérgio Sant’Anna, Márcia Denser, João Antonio, Antonio Torres, Oswaldo França Júnior, Adélia Prado, Márcio Souza e outros mais surpreendiam os leitores e os críticos com obras contundentes.

Publiquei meu primeiro livro, Não Passarás o Jordão, em 1977, e a história principal tinha como personagem o jornalista Wladimir Herzog, assassinado sob tortura no Doi-Codi em São Paulo, em 1975. O livro ganhara vários prêmios, mas ninguém se animava a publicá-lo, por causa do tema. Até que Fernando Mangarielo, da Alfa Omega, de São Paulo, teve a coragem de fazê-lo. Queria contratar todos os meus livros e fazer de mim “um novo Jorge Amado”. O Partido Comunista deu o maior apoio. Mas to-das as críticas que elogiavam o livro (exa-geradamente, percebe-se hoje), não podiam dizer do que ele tratava. A imprensa estava sob censura.

Brigamos com a censura – fizemos em Minas um manifesto que 1.046 intelectuais brasileiros assinaram – até que o ministro da Justiça do general Geisel, Armando Falcão, foi à TV dizer que nosso pedido não contava com o apoio da “sociedade brasileira”, que, pelo contrário, pedia era mais censura, para preservar “a moral e os bons costumes”.

Foi nesta época fervilhante que O Pasquim – o jornal mais influente da esquerda, apesar de já existirem o Opinião e o Movimento, onde também quase todos nós escrevíamos – resolveu criar uma editora, a Codecri, e chamou Jéferson Ribeiro de Andrade para dirigi-la. A primeira idéia de Jéferson foi publicar um livro policial de Otávio Ribeiro, seu primeiro best seller. O segundo livro da Codecri seria uma antologia de 12 contos da “novíssima” literatura brasileira.

Os escolhidos foram seis jovens contistas que estavam então se notabilizando por seu talento precoce: o próprio Jéferson, um jornalista combativo e escritor sem grande brilho; o poeta mineiro Antonio Barreto, 22 anos, que começava a escrever ficção; o paranaense Domingos Pellegrini, 28 anos; o carioca Julio César Monteiro Martins, de apenas 21 anos; o gaúcho Caio Fernando Abreu, 27 anos, e eu, 25 anos. Quando publiquei meu segundo livro de contos, Os Lábios Úmidos de Marilyn Monroe, pela Ática, dediquei-o aos seis, a quem chamava de “os paladinos do Oeste”.

Era uma turma legal que nada tinha em comum além do amor pela literatura e a revolta contra alguma coisa: Jéferson era naturalmente revoltado, por causa do mau-humor; Barreto, Pellegrini e eu éramos marxistas e queríamos derrubar a ditadura a qualquer custo, ainda que derramando sangue; Caio, infeliz, revoltava-se naturalmente contra a trágica condição humana; e Julio César, um burguês liberal, cujo talento tinha o mesmo tamanho, enorme, da vaidade juvenil, revoltava-se contra o fato de, aos 21 anos, ainda não ser considerado o maior gênio da literatura brasileira de todos os tempos.

O livro saiu com o título de Histó-rias de um Novo Tempo, ilustrado por Marcos Coelho Benjamin, hoje re-nomado artista plástico. Na época, imi-tava Crumb e já era genial. Avaliamos as ilustrações, no final de 1976, na casa de Ziraldo, sócio da Codecri, no Rio. Uma filha de Ziraldo, não me lembro se Daniela, tinha acabado de chegar do morro, onde comprara um tijolo de maconha na casa do músico Sérgio Ricardo. Chegara com o namorado, que se parecia muito com Gerald Thomas (ou era ele mesmo).

Histórias de um Novo Tempo saiu com 20.000 exemplares e vendeu tudo em 15 dias. A segunda edição, mais 10.000, também acabou logo. Antes de sair a terceira edição quase todo mundo já tinha brigado por algum motivo.

O que terá acontecido conosco? Primeiro, quatro dos “paladinos” foram ao Rio para dar uma entrevista ao Pasquim: eu, Caio, Julio e Jéferson. Barreto e Domingos não puderam ir. A entrevista saiu com trechos naturalmente cortados (para caber nas duas páginas do jornal) e Caio odiou. Escreveu uma carta ao Pasquim, que respondeu, como de hábito, mandando-o lamber sabão ou algo parecido. A partir daí ninguém se entendeu mais.

Tinha sido bom até ali. Nós, os seis “paladinos”, às vésperas da glória – sair numa antologia com as bênçãos do Pasquim – imaginávamos lançar um manifesto literário e até tentar repetir, em algum lugar (Rio, Belo Horizonte, São Paulo), a Semana da Arte Moderna de 1922! Acho que a idéia foi de Julio César Monteiro Martins, nosso maior megalômano. Trocávamos cartas febrilmente. Ansiávamos por nos conhecer pessoalmente, o que se deu com o lançamento da antologia.

Caio teve um livro – Pedras de Calcutá – lançado pela Alfa Omega. Posteriormente se desentenderia com o editor Fernando Mangarielo, que na mesma época lançou o best seller A Ilha, de Fernando Morais. As más línguas (ou seriam boas?) insinuavam que Mangarielo recebia uma subvenção de Moscou. Julio César e Jeferson saíram pela Codecri, que imediatamente publicou meu terceiro livro em dois anos, A Rebelião dos Mortos, que a Polícia Federal quis apreender e depois desistiu. Domingos foi publicado pela Civilização Brasileira. Fazíamos palestras e debates nas Universidades. As estu-dantes mais belas ajoelhavam-se a nossos pés. Éramos os grandes heróis da resistência.

No final de 1977, pouco antes de me mudar para São Paulo, ganhei um prêmio literário da revista Status, com Ricardo Ramos, Rubem Fonseca e Gilberto Mansur na comissão julgadora. Era um bom dinheiro. Deixei meu filho Alexandre, com oito meses de idade, com a avó e, com minha mulher Sylvia (um casamento já em crise), fui visitar Caio em Porto Ale-gre e Eduardo Gudiño Kieffer e Jor-ge Luis Borges em Buenos Aires.

Em Porto Alegre, hospedado na casa de Caio, Sylvia na cozinha, Caio disse que me amava.

Foi um choque. Eu tinha tido uma primeira, única e última relação homossexual (ativa) aos 16 anos, com um jovem artista que se transformou depois num astro da jovem guarda. Foi o bastante para decidir, definitivamente, que eu gostava era mesmo de mulheres e ponto final. Como dizer a Caio que eu gosta- va dele, mas não para fazer sexo?

Eu havia escrito, com minha completa ausência de censura, alguns contos com temática homossexual. Tinha dito a Caio que alguns eram autobiográficos e era verdade: contavam histórias do início da adolescência, quando um menino a caminho de tornar-se adulto ainda procura sua verdadeira identidade. Acho que Caio viu naquilo uma ponta de esperança: eu, com quem ele tinha tantos pontos em comum, principalmente a angústia exis-tencial, poderia ser o companheiro eterno de sua triste e solitária vida até então. Com o casamento em crise, quem sabe?

Ao longo dos anos eu perceberia que, apesar da amizade, algo se rompera. Eu era certinho demais, conservador demais, equilibrado demais – careta. Eu e Caio podíamos tomar chimarrão juntos, fumar maconha e beber chá de cogumelo alucinógeno, mas, na hora de compartilhar os corpos, lá ia eu para um canto, solitário e discreto. Não, aqui-lo não.

Mas formávamos um grupo e durante alguns poucos meses tentamos levar as coisas. Logo a falta de talento de Jéferson e o excesso de ambição do juvenil e impetuoso Julio César lançaram Caio numa neurose descontrolada. A reação jocosa do Pasquim diante de suas críticas – o jornal mandara-o “se roçar nas ostras” – deixou Caio amargurado.

Caio estava triste também por outros motivos. Julio César, o geniozinho simpático das cartas, na vida real era um mulherengo vaidoso que falava o tempo todo e não gostava de escovar os dentes e tomar banho. Domingos Pellegrini era marxista demais, um grandalhão saudável que a qualquer momento poderia pegar numa metralhadora e sair atirando em ditadores. Caio, tímido, sensível e frágil, via aquilo com horror. Jéferson era pequeno demais. Barreto sentia-se feliz com uma garrafa de cachaça ou um barril de chope: depois de certa hora, era impossível ouvir dele qualquer frase com sentido. Eu era, afinal, o único capaz de entendê-lo, de perdoá-lo por suas implosões depressivas. Eu jamais o mandaria se roçar nas ostras ou entubar um robalo, como fazia o Pasquim.

Julio Cesar, sobre quem Caio escrevera uma página altamente elogiosa a seu livro Torpalium, publicado pela Atica, no jornal em que escrevia – passou a ser o demônio. Poucos meses antes Caio comparava-o a Glauber Rocha. Julio dizia que Caio era “o Ney Matogrosso da literatura brasileira”. Aproveitei a dica e pus Caio na capa da revista Inéditos, em pose bem feminina, com esse título. Mas Caio já não suportava o que con-siderava, em Julio César, uma certa propensão para a intriga e o jogo do poder. Julio era muito jovem e Caio foi injusto com ele: isso tudo passaria, um dia, mas Caio não queria esperar.

A coisa degringolou quando, diante do inusitado sucesso de Histórias de um Novo Tempo, os velhos se-nhores e senhoras do arraial literário começaram a caluniar os jovens contistas. Por que aqueles seis, e não outros? Por que não tinham sido 10, ou 20, os escolhidos? E por aí vai. Disgusting, diria Caio. Cada um, então, seguiu o seu caminho. A editora Codecri cresceu rapidamente e desinteressou-se do best seller de autores tão complicados. O livro parou na terceira edição.

O que aconteceu conosco

Que destino tiveram aquelas pessoas? Jéferson dirigiu a Codecri até seu apogeu. Foi mandado embora porque estava ganhando mais dinheiro do que os donos do Pasquim. Foi para a editora Record e a Codecri faliu. Hoje Jéferson mo-ra em Belo Horizonte e escreve muito pouco. Antonio Barreto ga-nhou mais de 50 prêmios, publi-cou vários livros de poemas, foi trabalhar numa rodovia no Iraque, transformou sua experiência em um romance e hoje continua em Belo Horizonte, escrevendo para crianças. Pellegrini publicou meia dúzia de livros, herdou do pai a direção de uma seita religiosa, a Perfect Liberty, desapareceu de circulação e acaba de retornar à cena literária, com um prêmio Jabuti e novos livros no mercado. Deixou de ser comunista e vive tranqüilo em Londrina, no Paraná.

Julio César Monteiro Martins decidiu finalmente que ou o Brasil era muito pequeno para ele ou ele era muito grande para o Brasil. Aprendeu italiano, mudou para a Itália, onde é professor de literatura e lá já publicou dois livros. Em italiano.

Parei de escrever – não escrevo ficção há 20 anos –, exerci o Jornalismo por 17 anos e acabei editor de livros.

Caio Fernando Abreu escreveu e publicou vários livros, passou a vida sofrendo e morreu de Aids falando abertamente da doença em suas crônicas. Tornou-se um autor cult da comunidade gay. De todos nós, foi o melhor.





O texto foi retirado do site da Geração Editorial, as cartas que Caio trocou com Emediato podem ser encontradas .

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